As transações imobiliárias, como compra e venda de imóveis, constituição de SPEs, operações de sale and leaseback e outras formas de transferência patrimonial, têm se tornado cada vez mais comuns no mercado brasileiro.

No entanto, à medida que essas operações crescem em volume e sofisticação, surge uma dúvida recorrente entre investidores, incorporadoras e empresas com ativos imobiliários: é necessário notificar o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre transações imobiliárias?

Essa questão ganhou novo fôlego com a publicação recente do entendimento do Tribunal do CADE, na Consulta nº 08700.007814/2024-75, que trouxe maior clareza sobre quais operações exigem notificação prévia e quais podem ser consideradas simples transferências patrimoniais, isentas dessa obrigação.

Neste artigo, a Bhay e Mota Advocacia Imobiliária analisa o atual posicionamento do CADE sobre o tema, explicando os critérios estabelecidos pela autarquia, os riscos jurídicos envolvidos e as recomendações para quem deseja realizar negócios com segurança.

O que o CADE regula?

O CADE é o órgão responsável por zelar pela livre concorrência no Brasil. Entre suas atribuições está a análise de atos de concentração econômica, ou seja, operações que podem afetar a concorrência nos mercados relevantes, como fusões, aquisições e incorporações.

A Lei nº 12.529/2011, que rege o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, estabelece alguns critérios de notificação obrigatória para atos de concentração, especialmente quando envolvem empresas e grupos econômicos de grande porte.

Mas será que todas as operações envolvendo imóveis precisam ser analisadas pelo CADE? A resposta depende de alguns critérios que explicaremos a seguir.

Transações imobiliárias são sempre atos de concentração?

Não. O CADE tem reiterado que nem toda transação envolvendo imóveis configura, por si só, um ato de concentração. Isso ocorre porque muitas dessas operações consistem apenas em transferência de bens patrimoniais, sem qualquer impacto na concorrência de mercado.

No entanto, algumas situações específicas podem sim caracterizar um ato de concentração e, portanto, demandar notificação obrigatória ao CADE, conforme prevê o artigo 88 da Lei 12.529/11.

A decisão recente na Consulta nº 08700.007814/2024-75 do Tribunal do CADE estabeleceu três critérios principais que, se presentes, indicam a necessidade de notificação:

1. Alienação de estabelecimento comercial

Quando a operação envolver mais do que apenas o imóvel, e incluir também bens operacionais, como equipamentos, estoques, fundo de comércio, pessoal, marcas, patentes ou contratos de fornecimento, a operação poderá ser considerada uma transferência de estabelecimento comercial.

Nesse caso, há impacto sobre a estrutura concorrencial do mercado e, portanto, a notificação ao CADE pode ser obrigatória.

2. Estabelecimento ativo ou com capacidade produtiva instalada

Mesmo que não esteja em operação no momento da transação, se o imóvel possuir capacidade produtiva instalada, como no caso de uma fábrica com linha de produção montada ou de um centro logístico pronto para funcionamento, a operação pode ser vista como transferência de ativo produtivo. Isso também acende o alerta para a análise concorrencial.

Segundo o CADE, o simples fato de o imóvel estar temporariamente inativo não basta para isentar a operação da notificação. Se houver potencial de retomada de atividades e o imóvel puder ser utilizado pelo comprador para reforçar sua atuação no mercado, a notificação se torna necessária.

3. Bem essencial

Há situações em que um imóvel, mesmo sem capacidade produtiva, é considerado essencial. Isso ocorre quando ele é indispensável à entrada ou permanência de agentes no mercado relevante, como galpões logísticos em áreas portuárias, terminais aeroportuários, ou centros de distribuição em regiões altamente restritivas.

Se o imóvel em questão não tiver substitutos próximos ou equivalentes e for crucial para a operação de determinado segmento, sua aquisição poderá representar uma barreira à concorrência, justificando a intervenção do CADE.

Quando a notificação não é obrigatória?

Na ausência dos três critérios acima (alienação de estabelecimento, capacidade produtiva ou essencialidade), a operação é considerada uma simples transferência patrimonial, sem efeitos concorrenciais relevantes.

Essa interpretação reforça o princípio da liberdade econômica, e evita que o CADE se torne um avaliador burocrático de operações que não representam risco à livre concorrência.

Riscos de não notificar quando necessário

É importante destacar que a ausência de notificação obrigatória pode gerar consequências graves, como:

  • Nulidade do negócio jurídico;

  • Aplicação de multa que pode ultrapassar R$ 60 milhões;

  • Imposição de medidas estruturais ou comportamentais pelo CADE;

  • Comprometimento da reputação empresarial perante o mercado.

Por isso, é fundamental que as empresas contem com assessoria jurídica especializada para avaliar, com base nos critérios do CADE, se determinada transação deve ou não ser submetida à análise concorrencial.

Considerações para o setor imobiliário

A decisão do CADE é particularmente relevante para empresas do setor imobiliário, como incorporadoras, fundos de investimento imobiliário (FIIs), construtoras e operadores logísticos, que realizam frequentemente operações com ativos imobiliários de grande porte.

Além disso, os contratos de sale and leaseback, cada vez mais utilizados para levantar capital com alienação de ativos operacionais, merecem atenção especial. Se envolverem bens com função essencial ou operacionalidade instalada, podem ser enquadrados como atos de concentração.

Empresas que pretendem adquirir terrenos ou imóveis operacionais devem considerar, ainda na fase pré-contratual, os seguintes pontos:

  • Estrutura e natureza do ativo;

  • Histórico de operação no local;

  • Existência de contratos de atividade econômica associados ao imóvel;

  • Potencial de substituição do ativo no mercado;

  • Perfil concorrencial do comprador e do vendedor.

Conclusão

Transações imobiliárias não são, por si só, obrigadas a serem notificadas ao CADE, mas algumas delas podem sim configurar atos de concentração, dependendo da natureza do ativo envolvido e das condições do negócio.

A decisão do CADE na Consulta nº 08700.007814/2024-75 representa um avanço no sentido de oferecer maior clareza e previsibilidade para o setor, mas também reforça a responsabilidade das partes envolvidas em realizar uma análise criteriosa da operação.

Se você está planejando uma aquisição imobiliária ou tem dúvidas sobre os impactos concorrenciais de sua operação, fale com a equipe da Bhay e Mota Advocacia Imobiliária.

Nosso escritório oferece assessoria jurídica especializada em direito imobiliário, garantindo que suas transações sejam realizadas com segurança, legalidade e tranquilidade.